Além do feed: por que precisamos formar um público que saiba mergulhar.

Por Babi Turcato

Além do feed: por que precisamos formar um público que saiba mergulhar.Vivíamos (ou ainda vivemos – mas está acabando) num tempo em que tudo precisa caber em 15 segundos. O vídeo tem que viralizar, o post tem que entreter, a música tem que bater logo no primeiro drop. Mas e a profundidade? Onde é que ela entra nesse jogo? Ou melhor: estamos formando público pra reconhecê-la quando ela aparece?

Essa é a pergunta que não quer calar e que precisa ser levada a sério por artistas, produtores, selos e comunicadores.

Profundidade não é o oposto de alcance. É o oposto de raso.
Tem quem diga que pra alcançar muita gente, é preciso simplificar. Repetir. Reduzir. Mas o problema não está em tornar a linguagem acessível, o problema está em ensinar o público a consumir só o superficial.

A gente se acostumou a treinar audiência pra pular de estímulo em estímulo. Música de 2 minutos. Reels com legenda em caixa alta. Carrossel mastigado em tópicos. Tudo tem que ser rápido, fácil, instantâneo.

Só que arte de verdade não nasce do instantâneo. Ela fermenta. Ela te exige. Ela transforma, não só entretém. E isso, precisa de tempo, presença e abertura emocional.

O público também precisa ser educado e isso é responsabilidade de quem cria.
Formar um público que consuma profundidade não é sobre elitizar discurso ou intelectualizar tudo. É sobre não subestimar a inteligência sensível de quem tá do outro lado. É acreditar que sim, existe gente com fome de sentir, de refletir, de mergulhar.

Mas pra isso, a gente tem que parar de entregar só o que “funciona” e começar a entregar o que move.
Tem que abrir espaço pra narrativas mais longas, silêncios mais incômodos, letras que não se explicam de cara.
Tem que bancar a arte que provoca, que exige reescuta, que deixa rastro, não só replay.

Quem só busca engajamento rápido, forma plateia. Quem investe em profundidade, forma comunidade.

A diferença é brutal.
A plateia vem e vai. Aplaude e some. Quer o próximo hit.
A comunidade se envolve. Te acompanha. Lembra de um verso que você escreveu há 3 meses. Manda inbox dizendo “aquilo me atravessou”.

Esse tipo de público não surge por acaso. Ele é cultivado. Com entrega constante, com coerência, com coragem de não seguir a maré.

Profundidade é um ato de resistência estética e política.
No meio de tanta aceleração, escolher a profundidade é quase um manifesto. É dizer: “não quero só likes, quero vínculo”.

É criar pensando em legado, não só em resultado.
É ocupar o feed com alma, e não só com pauta.
E, sim, isso custa mais tempo, mais energia, mais incerteza. Mas quem aposta nisso constrói o tipo de carreira que não morre quando a trend acaba.

Constrói relacionamento e isso, meu bem, nenhuma métrica do Instagram traduz.

Está na hora de parar de ensinar o público a correr e começar a convidá-lo a sentir.

A gente não precisa de mais conteúdos que viralizem.
A gente precisa de obras que permaneçam.
E pra isso, o desafio não é só criar com profundidade.
É formar um público que deseje mergulhar nela.

Porque, no fim das contas, o que sustenta o mercado e a alma, é o afeto que resiste à pressa.

E isso, só a profundidade entrega.